Tanto Microsoft e Sony nos mostraram nos últimos meses as visões de suas divisões de videogames para o futuro próximo. Acho que a expectativa é que eles tivessem showcases que fossem extremamente comparáveis, mas o que vi foi uma demonstração de como essas históricas rivais tem pretensões diferentes para o futuro, e como ambas tem a capacidade de obter sucesso mesmo seguindo diferentes mentalidades.
A PlayStation teve uma conferência mais tradicional, atendendo o que muitos esperavam, e provavelmente por isso foi vista como a mais bem sucedida neste ciclo. Nove jogos first-party foram mostrados, todos (pelo menos até agora) jogos exclusivos para a nova geração. Esses incluem novas IP’s, propriedades já com bagagem histórica na marca como Gran Turismo, Ratchet & Clank e Sackboy, e também novas iterações de grandes sucessos nascidos no PS4 como Horizon e Marvel’s Spider-Man.
Ficamos praticamente dois anos sem grandes anúncios first-party da Sony, o que possibilitou essa grande leva de revelações para o PS5, inclusive com projetos que, ao meu entender, foram inicialmente pensados para o PS4 fazendo essa transição para a nova geração.
Jogos first-party da Sony Interactive Entertainment nunca tiveram tanto prestígio crítico e comercial como na oitava-geração, e eles serão uma ferramenta importante para vender a ideia de um novo videogame.
Muito se fala por trás das cortinas digitais que os primeiros dois anos do PS5 vão ter muito conteúdo, e que inclusive todos esses jogos first-party mostrados em Junho estão com lançamentos planejados para esse período, o que seria um grande salto quando comparado com o mesmo período inicial de vida do PS4. Isso é um reflexo do desejo da Sony de fazer uma transição saudável para a nova geração, emulando o que surpreendentemente aconteceu com o PlayStation 4, mas dessa vez com o software de qualidade convincente para facilitar essa transição.
Para isso acontecer, eles também apostaram nas parcerias de marketing third-party que deram tanto certo no passado. No seu showcase, franquias como NBA2K, Resident Evil e de forma talvez infame para alguns, GTA5, também apareceram. Não são jogos exclusivos, mas que criaram identificação na plataforma, sejam casos recentes como NBA2K ou já históricos com Resident Evil e GTA. Imagino que ela buscará continuar suas parcerias com Call of Duty, Fortnite e FIFA também.
Além disso tivemos surpreendentes acordos de exclusividade temporária revelados para jogos como Deathloop, Ghostwire Tokyo e Project Athia, um novo jogo da Square-Enix. Também se fala muito que mais acordos com third parties dessa escala vão acontecer, em uma estratégia que indica ainda mais essa sede por popular a plataforma de conteúdo o mais rápido possível.
O que temos visto de resposta do público quando analisando algumas métricas pelas redes sociais é bastante interesse na nova plataforma. O desafio final agora é traduzir o interesse em adoções do PS5, e os passos cruciais ao meu ver são cair num preço que não assuste o mercado como foi com o PlayStation 3, e mostrar mais destes jogos, que funcionam como boas ferramentas de marketing. Provavelmente veremos mais algum tipo de evento (um State of Play foi anunciado hoje, mas o foco não vai ser o PlayStation 5), com mais detalhes da plataforma a serem revelados, e com possivelmente ainda mais um ou outro anúncio first-party que sirva de chamariz também.
Jim Ryan foi enfático ao dizer que a Sony Interactive Entertainment acredita em gerações, o que não me surpreende porque até na geração do PS3, onde houveram falhas massivas na estratégia e comunicação, a empresa conseguiu se recuperar e eventualmente obter sucesso com a plataforma. E afinal, essa é a forma que eles historicamente operam, por isso é óbvio que para eles, o mais seguro é que o molde do mercado continue o mesmo, já que esse tipo de pensamento de gerações é o modelo de negócio de videogame dentro da Sony. Salvo alguma movimentação muito errada, não vejo porque o PlayStation 5 não seria uma plataforma popular também.
Do outro lado, para muitos o evento da Xbox pareceu inefetivo quando analisando o papel de promover o Xbox Series X. Não foi necessariamente por falta de anúncios, já que jogos como Fable, State of Decay 3 e Avowed forma revelados para a nova geração, mas talvez a forma que estes jogos foram mostrados para justificar uma transição de geração.
Mas ao meu ver, o evento foi o reflexo da nova estratégia da divisão Xbox, que é apostar em demonstrar não necessariamente as vantagens de uma única plataforma, mas de todo um ecossistema.
Em 2018 e 2019 vimos o compromisso em fortalecer seu catálogo de estúdios, aumentando a intensidade das suas iniciativas first-party como um todo. Alguns projetos que foram publicados recentemente já são frutos disso, uma vez que eram títulos já em desenvolvimento quando a Microsoft adquiriu estes estúdios, mas alguns grandes projetos demorarão um pouco a vir exatamente por conta dessas aquisições serem recentes.
Por isso vimos anúncios de jogos ainda na infância de produção como os já citados aqui. Não me incomoda que sejam anunciados tão cedo, vejo como uma demonstração desse compromisso com uma robusta produção de conteúdo visando recompensas a longo prazo.
Em conferências da Xbox no passado, tivemos por exemplo grandes demonstrações de third-party de parceiros como CD Projekt Red, Bethesda e Capcom, nessa eles foram substituídos por empresas com menos gabarito como GSC Game World, Fatshark, Bloober Team e Image & Form mas com o diferencial de que todos aqueles jogos serão lançados na plataforma, já inclusos no serviço do Game Pass.
Os jogos dos grandes parceiros third-party citados ainda estarão na plataforma é claro, o que vimos foi a Microsoft priorizar a narrativa do Game Pass, com exemplos que fazem do ecossistema do Xbox o melhor custo-benefício do mercado.
Outro ponto da estratégia que já está dando certo é popularizar os jogos que ela publica na plataforma do PC. Atualmente, três dos dez jogos mais vendidos na Steam são publicados pela Xbox Game Studios: Grounded, Sea of Thieves e Halo: The Master Chief Collection.
No momento, isso representa uma boa carga de receita vindo das vendas destes títulos, no longo prazo, imagino que a presença destes jogos na Steam possa fazer que mais usuários acabem assinando o Game Pass para PC, já que ele é também uma forma de acessar estes mesmos jogos, mas de forma mais barata. É fácil de apostar que Halo Infinite e Flight Simulator 2020 terão sucesso semelhante se não maior na plataforma, e que futuros jogos de Obsidian e inXile, estúdios muito conectados com o público de PC e agora de posse da Microsoft, também ajudarão nessa vigente popularização.
Uma IP que é quase sinônimo de Xbox, vai representar essa filosofia de games como plataforma melhor que ninguém. Na última Sexta-Feira, a 343 Industries confirmou que o multiplayer de Halo: Infinite será free-to-play, e imagino que provavelmente funcionará a base de passes de temporada como Fortnite e Warzone. A campanha poderá ser jogada pelo serviço do Game Pass, tanto nos consoles Xbox quanto no PC, e o jogo lançado esse ano servirá como base para o futuro da franquia segundo o estúdio, recebendo atualizações substanciais ao invés de sequências tradicionais.
Basicamente, para jogar o novo Halo, seja a aventura singleplayer ou partidas multiplayer, nenhum jogador terá a necessidade de gastar os tradicionais U$60 para experienciar um dos jogos mais aguardados dos últimos anos (apesar de essa opção existir também). Acho que não tem um exemplo maior de fé e compromisso com essa ideologia do que isso.
Com a adição do xCloud ao Game Pass em Setembro, abre se ainda mais uma via para o serviço, que é de estar em plataformas que nem necessitam de novos grandes investimentos por parte do consumidor.
A Microsoft ainda acredita em seus consoles, ela não projetaria o console mais poderoso de todos os tempos, e também um ‘’irmão menos parrudo’’ dele para servir de ponto de entrada na nova geração (o vindouro ‘’Lockhart’’ ou ‘’Series S’’) se ela não entendesse que ainda existe essa demanda por parte do seu público, mas esta é apenas uma das vias para a comunidade usufruir de seus produtos e serviços.
Sony continuará jogando praticamente da mesma forma que sempre fez, porque assim sempre obteve sucesso, e recentemente o poder da marca PlayStation é maior do que nunca, enquanto a Microsoft segue envisionando o mercado de videogames como algo de potencial muito maior que o nicho tradicional dos consoles.
Sei que em tempos de nova geração, o impulso é comparar essas empresas e seus novos consoles a ponto de tentar achar qual o produto é melhor ou então qual lado é o vencedor, mas cada vez mais, PlayStation e Xbox travam guerras diferentes no mesmo campo de batalha, num ponto que comparar alguns de seus aspectos nem faz tanto sentido, e no fim das contas consigo ver ambas vencendo seus embates individuais com PS5 e Xbox Series X.