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Por que a Sony não está (no momento) tentando replicar o sucesso do Game Pass?

Esse texto foi escrito antes do anúncio do aumento da assinatura da PS Plus no Brasil. Não acho que mude nada do que foi dito aqui, mas é uma pena que a situação que vivemos no país tem piorado ainda mais o acesso aos videogames no Brasil.


Quando uma geração de videogames termina, é comum que se crie uma discussão sobre quais os melhores jogos daqueles videogames, nós fizemos um programa inteiro sobre isso lá no 99vidas inclusive, mas acho que tão importante como, é discutir de quais formas o ato de jogar videogame se caracterizou naquela geração, e quais foram as novidades em termos de usabilidade naqueles consoles. Pensando assim, eu confortavelmente nomearia o Xbox Game Pass como a melhor ‘’coisa’’ introduzida na geração, um serviço que facilitou o acesso ao simples desejo de jogar videogame, tendo um catálogo extenso e bem variado, que aos poucos pode mudar até a forma que jogos são feitos.

É um serviço que cada vez mais cresce em termos de força deste catálogo, e também de popularidade. Hoje, contabilizando todas suas versões, existem mais de 23 milhões de assinantes de serviços Xbox Game Pass, um crescimento de mais de 5 milhões apenas nos últimos 3 meses. E com as recente aquisição da Zenimax por parte da Microsoft, e um início de parceria para botar grandes títulos third-party no lançamento no serviço, como ocorreu com Outriders e MLB The Show, o catálogo ficará ainda mais robusto e qualificado, e a tendência é que cada vez mais usuários enxerguem o serviço como um gasto quase que obrigatório pensando na sua qualidade e proposta de valor. 

Esse é um serviço tão impressionante, que apesar da Xbox Game Studios não ter publicado nenhum jogo completamente novo desde Setembro do ano passado, a sensação é que sempre existe algo novo para jogar nas plataformas que ele está presente, e isso é verdade porque ele não depende apenas de jogos first-party, ele vive de adições third-party de diferentes escopos e estilos. O indie do momento, jogos AA, ports de jogos já lançados em outras plataformas chegando no Xbox direto pelo serviço, e agora até produções de alto orçamento de grandes publishers, o serviço tem de tudo e aposta no seu sucesso baseado nisso. Escrevi um texto inteiro focado no Game Pass na semana passada

Então, por que a Sony, que com a divisão PlayStation é hoje discutivelmente a plataforma de consoles mais bem sucedida, ainda não fez grandes esforços para copiar um serviço de grande sucesso tanto comercial quanto de gosto popular? Bom, porque hoje ela já tem um próprio serviço de sucesso financeiro ainda maior, mesmo que esse não seja favorito de público e esteja causando tanto impacto no mercado como o Game Pass.

A PlayStation Plus começou na geração PS3 como um benefício que ofereceria um catálogo de jogos, backup de saves na nuvem e também descontos na PS Store aos seus assinantes. Na geração PS4 foi adicionada a habilidade (na verdade a restrição) de se poder jogar jogos online para os assinantes do serviço, e hoje ela é associada com basicamente essas duas coisas: receber um par ou mais de jogos gratuitos no mês, e poder desfrutar de multiplayer online no seu console.

No final de Março, o serviço chegou a 47.6M de assinantes, um patamar recorde, e a Sony reportou em Fevereiro de 2021 que 87% dos compradores de PS5 naquele momento, eram assinantes do serviço. Em Outubro de 2014, eram menos de 8 milhões de assinantes, então durante a geração PS4 o que se viu foi um crescimento enorme do serviço . Estes são números expressivos, que levam também a uma receita considerável. Nos últimos anos, uma média de 20-25% da receita bilionária da PlayStation Network veio de assinaturas, com a maioria dessa porcentagem, de contribuição da PS Plus.

Talvez a razão desse crescimento esteja fortemente atrelada a restrição de se jogar online (apesar de que principalmente no mercado atual, os maiores jogos multiplayer na plataforma são free-to-play e não necessitam de uma assinatura), mas a discussão sobre os jogos que foram o seriam ofertados no serviço geram grandes discussões todos os meses.

É por isso que principalmente no último ano tem ocorrido um claro esforço por parte da PlayStation em fortalecer a Plus. Sempre houveram críticas à qualidade dos jogos ofertados, tendo uma oferta inconsistente de meses bons e ruins, mas de 2019 pra cá tem sido mais recorrente a inclusão de grandes jogos, e até Final Fantasy VII Remake foi oferecido recentemente, e desde o lançamento do PlayStation 5, mensalmente jogos que são lançamento na plataforma, são incluídos como parte do serviço. Para os usuários do novo console foi criado também um catálogo intitulado de PlayStation Plus Collection, trazendo mais de 20 jogos da geração PS4 entre eles alguns dos maiores hits first-party como God of War, Uncharted 4 e Bloodborne, e também sucessos third-party de grande história com a plataforma PlayStation como Resident Evil 7, Persona 5, Monster Hunter World, Final Fantasy XV e Crash Bandicoot. E recentemente, foi divulgado que na Polônia começaram testes para oferecer no serviço da PS+ um catálogo de filmes e séries da Sony Pictures como mais um benefício para quem é assinante.

Em contra partida, a Sony nem menciona nos seus materiais de marketing do PS5 o serviço do PlayStation Now, que hoje seria o mais similar ao modelo do Game Pass. Por um momento pareceu que ela estava dando maiores passos com o PS Now, dando a opção de baixar jogos de PS4 ao invés de disponibilizar jogatina apenas por streaming, e baixando seu preço para U$10 por mês, mas basicamente parou por aí. A última vez que foram reportados os números de assinantes desse serviço foi em Abril de 2020, naquela época 2.2M apenas. Ela poderia estar direcionando estes recursos para o Now, para criar uma disputa com o Game Pass, mas prefere não o fazer, mantendo a Plus como seu claro foco na área de serviços.

Basicamente, a Sony tem preferido investir num modelo bem sucedido dela mesma (e que tem um investimento necessário bem menor do que um ‘’Netflix dos games’’) do que tentar replicar o Game Pass, principalmente porque no momento a PS+ vem numa fase de crescimento regular ainda. Imagino que alguém vá perguntar o porque de ela não poder investir nos dois ao mesmo tempo, e basicamente, apesar de ser um negócio de bastante sucesso, a PlayStation ainda é uma empresa de recursos limitados de certa forma. A Sony Corp como um todo depende muito da Sony Interactive Entertainment hoje, então é mais prudente fazer movimentos que vão ser menos arriscados e que vão prover uma receita consistente.

A minha indagação fica em até quando ela vai priorizar esta estratégia, e quando ela decidir mudar, terá perdido o tempo certo de o fazer? Já estamos indo para 11 anos de Plus, e com poucas mudanças e um plano relativamente econômico de investimento ele chegou nesse patamar de quase 50 milhões de assinantes. Com o Game Pass a Microsoft já criou um modelo mais ambicioso, e que tem recebido investimentos maiores a cada passo, e isso resultou em uma conversão de metade dos usuários da Plus em menos de 4 anos de mercado. Qual vai ser a ação da Sony quando ele inevitavelmente atingir patamares similares? Se a Plus continuar crescendo, mesmo que num ritmo ainda mais lento, talvez nada, se não, talvez seja tarde demais.