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Jogos mais caros e a nova etapa da guerra de consoles

Alta nos preço dos jogos abre oportunidade para a Microsoft


Guerra de consoles entre fãs é embaraçosa. Guerra de console entre fabricantes é ótima de acompanhar. É um jogo cuja estratégia envolve diversos aspectos da mídia, entre eles o econômico. 

Teremos em breve mudanças significativas na indústria. O preço de lançamento dos jogos AAA, de US$ 60, não faz sentido para ninguém. Por um lado, quem vende acredita que o teto de US$ 60 vigora há muito tempo, é preciso subir. Pelo o que NBA 2k21 sinaliza, aumentará em US$ 10.

E no Brasil prepare o seu bolso, a tendência era de alta antes desse reajuste da gringa.

Do ponto de vista do comprador é muito elevado em comparação a outras ofertas de entretenimento e arte. Mesmo dentro do videogame, em questão de semanas o mesmo título de US$ 60 é oferecido a preço mais baixo, com mais conteúdo, com bugs extirpados. Os chamados early adopters são punidos. 

NBA 2K21 e suas diferentes versões

O preço para participar do hype não está muito elevado? E com pouca gente participando da conversação no lançamento, não elimina o próprio conceito de hype?

Economia, porém, não é ciência exata por causa do comportamento do consumidor. A venda de 4 milhões de cópias de The Last of Us Part II em três dias joga no lixo qualquer elucubração feita na planilha ou na calculadora. 

A Sony permanece convicta no investimento em grandes produções exclusivas (por mais que algumas delas migrem para o PC depois de um tempo). É um poderoso argumento para manter sua plataforma na liderança do mercado de consoles. 

Mas essa postura é sustentável? Com a Microsoft oferecendo altas produções no Game Pass,  serviço de assinatura estilo Netflix, aumenta a pressão nos produtores. Como cobrar US$ 60~70 em um jogo se isso vale meio ano de acesso a pesos-pesados como Gears 5 e Red Dead Redemption 2

The Last of Us Part II

Grandes tombos

Antes de declarar o apocalipse das altas produções, convém lembrar que na indústria do videogame tamanho de empresa não é documento. 

Atribui-se à Atari o crash de 1983. Fora certas especificidades — muitas empresas produziram porcarias na época –, a empresa do jogo E.T. the Extra-Terrestrial  é o símbolo máximo da derrocada. Lembremos que quem estava no comando da companhia à época era a Warner, que colocou executivos com cabeça de planilha na liderança. 

Salto temporal, chegamos a 2020. O Stadia, da potência Google, teve um começo áspero e agora passa por cortes no preço. Por maior que seja o esforço do Google, o Stadia permanece como candidata a constar no infame cemitério de serviços descontinuados pela empresa. 

A Amazon, gigante avaliada em mais de US$ 1 trilhão, teve um clamoroso fracasso em sua estreia como produtora de videogame. O shooter gratuito para PC Crucible foi lançado e “deslançado” em menos de dois meses. Foi rebaixado a beta fechado para ser retrabalhado.

Chamar Crucible de “primeiro jogo da Amazon” é impreciso, mas dada a ambição e escopo do projeto pode ser assim considerado. Na Twitch, a plataforma de transmissão ao vivo da própria Amazon, o jogo raramente conseguia juntar mais de cem espectadores; a Steam, plataforma onde o jogo era disponibilizado, registrava menos de 200 jogadores por dia. 

(Escrevi sobre o Crucible para a Folha, para quem quiser ler mais)

Xbox Game Pass

Microsoft é outra empresa imensa, que coleciona tropeços em sua estratégia nos videogames. O fechamento do Mixer, plataforma concorrente da Twitch, é, na melhor das hipóteses, a última falha de uma geração que começou com um console apresentado como se fosse um aparelho para assistir TV. 

No entanto, não dá para subestimar a empresa fundada por Paul Allen e Bill Gates. Mais do que um fracasso, o Xbox One é um caso de um reposicionamento hercúleo. 

A Microsoft passou a ter como o foco a quantidade ao invés da qualidade. Não vejo demérito em mirar o chamado custo/benefício. A sra. Windows encontrou seu lugar, onde o uso de sua força bruta se encaixa. 

Diante de uma economia chacoalhada pela Covid-19, em tese é um momento propício para essa filosofia, há uma oportunidade para a Microsoft provar que seus serviços e plataforma são mais interessantes. Vai precisar arrumar a casa, da interface do console à comunicação. 

No próximo dia 23, a Microsoft faz novo evento do Xbox Series X. É uma das últimas chances da empresa de esclarecer sua proposta, vital para começar a corrida da próxima geração com força. Veremos se a Microsoft consegue aproveitar.


Este texto foi escrito por João Varella, colaborador de games na Folha, fundador da editora Lote 42 e autor do livro ”Videogame, a evolução da arte”, disponivel no site da Banca Tatuí